A vida é la movida.
É Sagres.
É Boémia.
E choco frito.
Tudo o que a gente gosta.
Uma esplanada à beira-mar.
O sol.
A maresia.
A boa vida.
A sorna.
O fado.
A morna.
O dolce far niente.
Com a gente de quem se gosta.
Muito, pouco ou nada.
Mais a Nossa Senhora dos Milagres
Que te acode,
Quando aflito.
Enquanto a maré sobe.
E a noite espreita.
E a morte não pré-avisa.
Olha a moreia da costa,
Que é a melhor do mundo.
A vida é pregão.
A vida é merda.
A vida é Sagres, é Boémia.
A vida é hipoglissémia.
A vida é adrenalina.
A vida é prego a fundo.
A vida é stresse.
Sexta-feira à tarde,
Ao fim da tarde,
Uma hora antes do pôr do sol.
A vida é festa.
La fiesta, amigo.
Vengo de la altiva Castilla.
No TGVê espanhol
Que não paga imposto
único
de circulação.
Que o futuro não paga imposto,
Nuestro hermano.
Pressupuesto, amigo.
Que viva la siesta!
Que viva la vida!
Mas agora que vem aí a crise,
Como é que eu chego à ponta mais
acidental
Da Europa ?
Para comer o meu choco frito,
No bar da Peralta,
A las cinco de la tarde.
Com navios negreiros,
Fantasmagóricos,
Na linha do horizonte,
A quinze milhas.
Com os jacobinos do Junot
Na película da memória.
O Vimeiro aqui tão perto.
Com autos de fé,
Mouros, judeus, corsários,
No meu ADN de português
Sem história,
Maçarico, maltrapilho, errante.
No mar onde naufragam
Todas as boas consciências
E se afinam as ciências,
As ditas duras mais as ditas moles.
Um homem sorri com meia-cara
O sorriso amarelo do cinismo.
Aqui,
No cabo da terra,
Onde se proclama a ditadura do sucesso.
E do novo riquismo.
Com o isco
Da vã glória de ganhar
A medalha olímpica.
A vida eterna.
O Nobel.
Um lugar no paraíso.
O Olimpo,
Condomínio fechado dos deuses.
Que dos perdedores não reza a História.
A vida é la movida
No Peralta Bar,
Que não vem na lista do Expresso
Da Coma, Mesa & Roupa Lavada.
Haja lugar à mesa,
comprida,
e valha-nos Baco, velho compincha.
Viva o Portugal do petisco!
Viva o mês de Agosto!
Deixei os meus velhos
Institucionalizados
Nacionalizados
Alegaliados
Sedados
Securizados
Acorrentados
À árvore do Welfare State.
Na Atalaia,
A caminho do Porto das Barcas.
Ficaram aos cuidados de uma ucraniana
Que era enfermeira na sua terra,
E da santa padroeira
dos pescadores,
A Nossa Senhora da Guia.
Que há sempre uma santa para todas as aflições,
Das dores do parto
À agonia da morte.
Que às vezes, mais vale a morte
Que tal sorte.
Tenho insónias às cinco da manhã,
Mesmo sabendo que da janela
Do quarto dos meus velhos
Há uma linda vista para as Berlengas.
E que a associação é
Cultural,
Social,
Artística,
Desportiva
e Humanitária.
Minha mãe, minha avozinha,
Tens a graça até no nome,
Não é por seres mais velhinha
Que de amor passarás fome.
Passo pela loja do chinês,
Fugido de Tianamen,
E compro um prato
De Alcobaça, pintado à mão,
De contrafação.
Com quadras pimbas
Ao amor de mãe…
Brilhas como uma estrela,
No teu quarto, lá no lar,
Tens uma linda janela,
Com vista de céu e mar.
Quem disse que a vida é bela,
E que as mães é que dão cabo dela ?
Desligo o botão da televisão,
Puxo o reposteiro da janela
Donde vejo o mundo a cor de rosa,
Arrumo o cavalete
E as tintas do arco-íris.
E peço uma posta de moreia frita
E um copo de tinto.
É a hora da doce melancolia
E do leve sentimento de culpa
E da idiota reflexão sobre a idiossincrasia
De se ser velho, europeu e português,
Na ponta de uma navalha
Da economia
Da política
Da demografia
E da geografia.
Não escolhi nascer.
Não escolhi pai e mãe.
Não escolhi o pedaço de chão onde fui parido.
E não sei o que farei com este poema,
Que não vale um algoritmo
Nem um simples teorema.
E que não é de protesto
Nem é manifesto.
Entre a ciência da morte
E a fé da ressurreição,
Haverá sempre uma santa
Que me valha.
Ou uma azinheira ou uma carvalha
Onde possa pôr a uma santa aparecida
Que me salve da má consciência
De la movida.
Lourinhã, Praia da Peralta, Agosto de 2008
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segunda-feira, setembro 01, 2008
domingo, setembro 09, 2007
Blogantologia(s) II - (47): SOS, Mare Nostrum
Fotos: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.
SOS, Mare Nostrum
Poderei não suportar
O dia em que o mar
Se retirar da minha praia.
Poderei adoecer
Ou até mesmo morrer
Se me tirarem o mar
Da minha rua.
E o pôr do sol
Sobre a linha do horizonte da minha janela.
E o cheiro a maresia
No meu almofariz de cheiros.
E as neblinas matinais
Lavando os meus olhos.
Não sei se conseguiria fazer o luto
Do Mar Morto.
Emigrarei para o hemisfério sul
Quando me tirarem o mar do Norte,
O mar do Serro,
O Mare Nostrum,
As Berlengas ao fundo,
O vento nos canaviais
Na Praia do Zimbral.
Posso gostar das tuas montanhas
E das tuas albufeiras
E das tuas florestas de carvalhos,
Da gente rude e franca do Norte,
Mas preciso de regressar ao Sul,
De vez em quando,
Para respirar como as baleias.
Um exército de lapas
Move-se de rocha em rocha
Como sinal premonitório
Da transmigração do mar.
Praia da Peralta,
8 de Setembro de 2007
quarta-feira, novembro 09, 2005
Blogantologia(s) II - (15): O amor em Agosto
Publicado originalmene no Blogue-fora-nada, post de 18 de Agosto de 2005 > Blogantologia(s) - XXIX: Viagens nas minhas praias imaginárias . Revisto nesta data.
O amor em Agosto
Praia de Paimogo.
Estas pedras estão aqui
Há milhões de anos.
E eu não sei dizer-te
Por que é que estas pedras
Estão aqui
Há milhões de anos.

Uma enseada, uma cratera, um lago.
A Praia de Paimogo foi talhada
A ferro e fogo.
Mas se eu fosse deus,
Todo poderoso senhor
Ou até vulcão,
Tê-la-ia desenhado,
Com muita ternura,
Sob a forma de coração.
Só para ti, meu amor.
Estas pedras estão aqui
Muito antes dos dinossauros
Evoluírem e dominarem
O planeta azul.
Que afinal não era assim tão azul
Quanto o pintavam.
Visto da janela do teu quarto,
Em Candoz,
O vale era o mundo
E era verde,
Tal como em A Cidade e as Serras,
Do Eça de Queiroz.
Muito antes do mar,
E do pôr do sol sobre o mar,
Muito antes de saberes
Onde ficava a praia da minha infância.

Nem vale.
Nem pombas.
Nem praia.
Na Praia do Vale de Pombas,
À maré cheia, à praia-mar,
Há apenas um fio de água doce
Que mantém os cordões umbilicais
Do infinitamente pequeno da vida
Ligados ao infinitamente grande
Dos corpos celestiais.
Vale de Pombas:
Aqui caiu uma chuva de meteoritos.
Um dia hei-de lá levar-te.
Praia de Vale de Frades.
Mas que sei eu de cronogeologia
Para te dizer que estas pedras estão aqui
Há tantos milhões de anos ?!
Sei apenas que, de acordo
Com toda a teoria das probabilidades,
Estas pedras vão ficar aqui,
Muito depois da minha morte,
Muito depois da extinção da minha espécie.

Praia da Peralta.
O melhor do mês de Agosto
É enterrar a cabeça na areia
E escutar.
O mar.
A voz rouca do mar.
Que chegou até aqui,
Muito antes de mim e de ti,
E que vai ficar aqui
Muito depois de mim e de ti.
Não há farol
Na Peralta,
Para eu poder avisar a malta.
Enquanto o teu país arde
Ou o que resta dele.
Na Peralta passam navios ao largo.
Como manadas de elefantes.

Porto Dinheiro
Um espesso nevoeiro
Cobre as falésias
Em Agosto.
Até aqui chegavam
As galés romanas.
E os barcos dos piratas.
Não sei se o sítio tem padroeiro
Ou orago.
Nem sei se por aqui passava
O teu caminho de Santiago.
Praia de Vale de Frades.
À volta de um prato de sardinhas,
A vida pode não ter
Metafísica nenhuma
E mesmo assim ser
Pura,
Emoção pura,
E simples,
Prazer simples.
Mandei pôr mais um prato
Na mesa, sem toalha,
Virada para o Mar do Serro.
Não me esqueci do pão,
Das sardinhas, das batatas,
Dos pimentos, da salada e do vinho...
Esperava por ti,
Que eras a oficiante da vida.

Na Peralta,
Na malhada grande,
Eu poderia ter sido feliz
Entre apanhadores de lapas e de ouriços.
Mesmo sabendo
Que estas pedras estão aqui
Muito antes de mim,
Há milhões de anos.
Mesmo não tendo
Todas as respostas
A todos os porquês.
No Porto das Barcas
Não há ciência,
Apenas sapiência,
Que é a mais antiga das virtudes.
Porto das Barcas:
Um navio fantasmagórico
Entra pela terra adentro.
Praia do Caniçal:
Podia trepar
Pela minha árvore genealógica
Até ao paleolítico superior.
Pelo leito dos rios
Que sobem, secos,
Até às grandes fossas marinhas.
Porto das Barcas.
Daqui avistamos as Berlengas.
E a Nau Catrineta
Que já nada tem para nos contar.
Porto Dinheiro.
Aqui deito contas à vida.
Aqui conto as marcas
Do tempo.
Aqui lanço a âncora.
Aqui fui carpinteiro de naus.
Aqui, Plínio, o Velho,
Poderia ter fundado a paleontologia.
Mas, não:
Morreu em 69 a observar
A erupção do Vesúvio.
Praia do Valmitão
Podia ter sido ilha de corsário
Ou baía de tubarão.
A ter bandeira,
Só a preta,
Com caveira.
Praia da Areia Branca:
Não te conseguiram amar
Sem te possuir e violar.
Livro Sexto, de Sophia.

Praia do Areal:
Há uma seta
Que indica o sul.
O sol.
A zona dos chapéus.
O espaço rigorosamente vigiado
Dos amantes.
O risco de cancro da pele.
A rota da seda.
A sede.
Os amores de verão.
A morte.
Saio noutra estação.
Volto à Peralta
Para partilhar contigo
A magia do sol posto
No Atlântico norte.
O amor em Agosto.

Fotos: Praias do concelho da Lourinhã
© Luís Graça (2004-2005). Direitos reservados.
O amor em Agosto
Praia de Paimogo.
Estas pedras estão aqui
Há milhões de anos.
E eu não sei dizer-te
Por que é que estas pedras
Estão aqui
Há milhões de anos.

Uma enseada, uma cratera, um lago.
A Praia de Paimogo foi talhada
A ferro e fogo.
Mas se eu fosse deus,
Todo poderoso senhor
Ou até vulcão,
Tê-la-ia desenhado,
Com muita ternura,
Sob a forma de coração.
Só para ti, meu amor.
Estas pedras estão aqui
Muito antes dos dinossauros
Evoluírem e dominarem
O planeta azul.
Que afinal não era assim tão azul
Quanto o pintavam.
Visto da janela do teu quarto,
Em Candoz,
O vale era o mundo
E era verde,
Tal como em A Cidade e as Serras,
Do Eça de Queiroz.
Muito antes do mar,
E do pôr do sol sobre o mar,
Muito antes de saberes
Onde ficava a praia da minha infância.

Nem vale.
Nem pombas.
Nem praia.
Na Praia do Vale de Pombas,
À maré cheia, à praia-mar,
Há apenas um fio de água doce
Que mantém os cordões umbilicais
Do infinitamente pequeno da vida
Ligados ao infinitamente grande
Dos corpos celestiais.
Vale de Pombas:
Aqui caiu uma chuva de meteoritos.
Um dia hei-de lá levar-te.
Praia de Vale de Frades.
Mas que sei eu de cronogeologia
Para te dizer que estas pedras estão aqui
Há tantos milhões de anos ?!
Sei apenas que, de acordo
Com toda a teoria das probabilidades,
Estas pedras vão ficar aqui,
Muito depois da minha morte,
Muito depois da extinção da minha espécie.

Praia da Peralta.
O melhor do mês de Agosto
É enterrar a cabeça na areia
E escutar.
O mar.
A voz rouca do mar.
Que chegou até aqui,
Muito antes de mim e de ti,
E que vai ficar aqui
Muito depois de mim e de ti.
Não há farol
Na Peralta,
Para eu poder avisar a malta.
Enquanto o teu país arde
Ou o que resta dele.
Na Peralta passam navios ao largo.
Como manadas de elefantes.

Porto Dinheiro
Um espesso nevoeiro
Cobre as falésias
Em Agosto.
Até aqui chegavam
As galés romanas.
E os barcos dos piratas.
Não sei se o sítio tem padroeiro
Ou orago.
Nem sei se por aqui passava
O teu caminho de Santiago.
Praia de Vale de Frades.
À volta de um prato de sardinhas,
A vida pode não ter
Metafísica nenhuma
E mesmo assim ser
Pura,
Emoção pura,
E simples,
Prazer simples.
Mandei pôr mais um prato
Na mesa, sem toalha,
Virada para o Mar do Serro.
Não me esqueci do pão,
Das sardinhas, das batatas,
Dos pimentos, da salada e do vinho...
Esperava por ti,
Que eras a oficiante da vida.

Na Peralta,
Na malhada grande,
Eu poderia ter sido feliz
Entre apanhadores de lapas e de ouriços.
Mesmo sabendo
Que estas pedras estão aqui
Muito antes de mim,
Há milhões de anos.
Mesmo não tendo
Todas as respostas
A todos os porquês.
No Porto das Barcas
Não há ciência,
Apenas sapiência,
Que é a mais antiga das virtudes.
Porto das Barcas:
Um navio fantasmagórico
Entra pela terra adentro.
Praia do Caniçal:
Podia trepar
Pela minha árvore genealógica
Até ao paleolítico superior.
Pelo leito dos rios
Que sobem, secos,
Até às grandes fossas marinhas.
Porto das Barcas.
Daqui avistamos as Berlengas.
E a Nau Catrineta
Que já nada tem para nos contar.
Porto Dinheiro.
Aqui deito contas à vida.
Aqui conto as marcas
Do tempo.
Aqui lanço a âncora.
Aqui fui carpinteiro de naus.
Aqui, Plínio, o Velho,
Poderia ter fundado a paleontologia.
Mas, não:
Morreu em 69 a observar
A erupção do Vesúvio.
Praia do Valmitão
Podia ter sido ilha de corsário
Ou baía de tubarão.
A ter bandeira,
Só a preta,
Com caveira.
Praia da Areia Branca:
Não te conseguiram amar
Sem te possuir e violar.
Livro Sexto, de Sophia.

Praia do Areal:
Há uma seta
Que indica o sul.
O sol.
A zona dos chapéus.
O espaço rigorosamente vigiado
Dos amantes.
O risco de cancro da pele.
A rota da seda.
A sede.
Os amores de verão.
A morte.
Saio noutra estação.
Volto à Peralta
Para partilhar contigo
A magia do sol posto
No Atlântico norte.
O amor em Agosto.

Fotos: Praias do concelho da Lourinhã
© Luís Graça (2004-2005). Direitos reservados.
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